Quem responde por dívidas tributárias de empresas encerradas?

Recente decisão do STJ responsabiliza os sócios em caso de dissolução irregular

A responsabilidade pelo pagamento de tributos por terceiros está prevista no Código Tributário Nacional e demais leis complementares. Entretanto, a responsabilidade pelos tributos devidos pelas empresas é complexa e pode surgir em diversas hipóteses, desde a saída da mercadoria da indústria até o encerramento da pessoa jurídica.

A última, a responsabilidade pelos tributos não pagos pela pessoa jurídica que vier a encerrar as suas atividades, é que será analisada nesse texto. Especificamente, os créditos tributários cobrados pela Fazenda Pública em Execuções Fiscais redirecionadas contra os sócios ou administradores.

Os casos comuns são os de empresas abandonadas por seus sócios, após o insucesso do empreendimento, deixando dívidas tributárias e de outras naturezas pendentes de cumprimento.

Quando a Execução Fiscal pode ser direcionada contra os administradores?       

O Fisco, devido à complexidade estrutural, somente fica ciente da condição dessa empresa quando a Execução Fiscal já está tramitando e a citação não ocorre porque a empresa executada não é encontrada no endereço em que funcionava.

Nesses casos, a Procuradoria requer nos autos, através de petição simples, o redirecionamento da Execução Fiscal contra os gerentes, ou administradores, tendo como fundamento a norma do artigo 135, inciso III, do Código Tributário Nacional.

Após muita controvérsia, o Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento (Súmula 435) de que a empresa será presumida dissolvida irregularmente se deixar de funcionar em seu domicílio fiscal, sem a devida atualização do seu endereço nos órgãos competentes. Nesses casos, é legítimo o redirecionamento da Execução Fiscal contra os administradores.

A consolidação desse entendimento impôs aos empreendedores motivação extra para cumprir as responsabilidades com a finalização formal adequada dos empreendimentos, ou seja, a dissolução regular das empresas.

Responsabilidade sobre cargos com função administrativa

O descumprimento com os deveres de diligência relacionados à devida finalização das sociedades impõe o dever de arcar com as dívidas tributárias da empresa, entidade com pessoa jurídica distinta, pelos gerentes, diretores e administradores.

É importante salientar que o fundamento dos julgamentos que formaram a Súmula 435 do Superior Tribunal de Justiça tinham como objeto a norma do artigo 135, inciso III, do Código Tributário Nacional, conforme texto transcrito a seguir:

Art. 135. São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos:

[…]

III – os DIRETORES, GERENTES ou REPRESENTANTES de pessoas jurídicas de direito privado.

Portanto, a responsabilidade pelos tributos não pagos pela pessoa jurídica dissolvida irregularmente recairá sobre quem tinha a função de representar a empresa à época dos fatos geradores dos tributos, ou seja, os diretores e administradores, que têm o dever de dar um fim adequado ao empreendimento.

Nesse sentido, os sócios que não exerciam a função de administração da empresa não respondem da mesma forma que os diretores, administradores, etc.

O que é preciso fazer além do pedido de “baixa” da empresa? 

Pretendendo cumprir as determinações quanto à finalização adequada e regular das sociedades, sócios de micro e pequenas empresas, aproveitando os atributos da norma do artigo 9º da Lei Complementar nº 123/2006, simplesmente protocolaram pedidos de “baixa” nos órgãos competentes.

Entretanto, esses protocolos não acompanharam as demonstrações financeiras, principalmente balanço patrimonial, demonstrando a incapacidade de a empresa arcar com as suas obrigações, inclusive as dívidas tributárias.

A prática do protocolo das demonstrações financeiras no órgão de registro, juntamente com o pedido de liquidação da sociedade, importa em prática de boa-fé que demonstra a situação patrimonial da empresa, e que os sócios não esvaziaram ou esvaziarão o patrimônio existente.

STJ reforça a importância da demonstração da insuficiência de patrimônio da empresa (Fonte: Envato)

Novo entendimento do Superior Tribunal de Justiça 

Em maio deste ano, a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça deu provimento ao Recurso Especial da Fazenda Nacional para responsabilizar os sócios da empresa liquidada sem a demonstração da insuficiência patrimonial, conforme pode ser observado da ementa transcrita a seguir:

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO FISCAL. RESPONSABILIDADE DO SÓCIO. DISSOLUÇÃO REGULAR DE MICRO E PEQUENA EMPRESA. AUSÊNCIA DE CERTIDÃO DE REGULARIDADE FISCAL. INCIDÊNCIA DO ART. 134, VII, DO CTN. PRECEDENTES.

1. O Superior Tribunal de Justiça possui entendimento de que tanto a redação do art. 9º da LC 123/2006 como da LC 147/2014, apresentam interpretação de que no caso de micro e pequenas empresas é possível a responsabilização dos sócios pelo inadimplemento do tributo, com base no art. 134, VII, do CTN, cabendo-lhe demonstrar a insuficiência do patrimônio quando da liquidação para exonerar-se da responsabilidade pelos débitos. Precedentes.

2. Recurso especial provido.

(REsp n. 1.876.549/RS, relator Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe de 6/5/2022.)

A respeitável decisão, ainda, está fundamentada nas normas do artigo 9º, § 4º e § 5º, da Lei Complementar nº 123/2006, que instituiu o Regime do Simples Nacional, transcrito a seguir:

Art. 9º O registro dos atos constitutivos, de suas alterações e extinções (baixas), referentes a empresários e pessoas jurídicas em qualquer órgão dos 3 (três) âmbitos de governo ocorrerá independentemente da regularidade de obrigações tributárias, previdenciárias ou trabalhistas, principais ou acessórias, do empresário, da sociedade, dos sócios, dos administradores ou de empresas de que participem, sem prejuízo das responsabilidades do empresário, dos titulares, dos sócios ou dos administradores por tais obrigações, apuradas antes ou após o ato de extinção.

[…]

§ 4 o A baixa do empresário ou da pessoa jurídica não impede que, posteriormente, sejam lançados ou cobrados tributos, contribuições e respectivas penalidades, decorrentes da falta do cumprimento de obrigações ou da prática comprovada e apurada em processo administrativo ou judicial de outras irregularidades praticadas pelos empresários, pelas pessoas jurídicas ou por seus titulares, sócios ou administradores.

§ 5 A solicitação de baixa do empresário ou da pessoa jurídica importa responsabilidade solidária dos empresários, dos titulares, dos sócios e dos administradores no período da ocorrência dos respectivos fatos geradores.

O entendimento proferido pelo Superior Tribunal de Justiça reforça a importância da demonstração da insuficiência de patrimônio suficiente para o cumprimento das obrigações tributárias.

Dessa forma, a prática dos atos previstos na norma do artigo 9º da Lei Complementar nº 123/2006, sem preocupação com as normas subsequentes e com o entendimento das Cortes Superiores, é pior do que o próprio ato da dissolução irregular, visto que impõe a responsabilidade solidária a todos os sócios e não somente aos administradores.

Sendo importante salientar a importância de os empreendedores, sócios, cumprirem os atos para liquidação e dissolução das sociedades conforme previsto na legislação vigente, evitando assim assumir a responsabilidade pelas obrigações tributárias da empresa com o seu patrimônio pessoal.

Sendo importante salientar a importância de os empreendedores, sócios, cumprirem os atos para liquidação e dissolução das sociedades conforme previsto na legislação vigente, evitando assim assumir a responsabilidade pelas obrigações tributárias da empresa com o seu patrimônio pessoal.

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Qual é, então, a alternativa para os sócios? 

A alternativa aos sócios que pretendem afastar a responsabilidade pelas dívidas tributárias sobre o patrimônio pessoal, e quando não há ativo suficiente para o cumprimento das referidas obrigações, é o pedido de autofalência.

Conforme reiteradas decisões proferidas pelo Superior Tribunal de Justiça, a falência da sociedade é forma regular de dissolução, portanto, não pode ser indiscriminadamente utilizadacomo fundamento para a responsabilização dos administradores da sociedade falida nos termos da norma do artigo 135, inciso III, do Código Tributário Nacional.

Entretanto, essa situação pode mudar nos casos em que forem constatados crimes falimentares nos autos da falência, o que poderá suscitar a discussão sobre a responsabilização do administrador que descumpriu a lei.

A administração das dívidas tributárias é tarefa fundamental para os sócios e administradores de empresas em liquidação, sendo imensamente importante a assessoria de profissionais das áreas contábil e jurídica para o cumprimento adequado das normas e das decisões judiciais.

SAIBA MAIS: É possível atingir a empresa da qual o devedor é sócio?  

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Autor: Raphael Bernardes da Silveira (OAB/PR 40.542): Advogado – Direito Tributário e Mercado Financeiro e de Capitais

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