Regulamentação dos Criptoativos: O que você precisa saber e o que pode afetar o investidor.

Não é de hoje que se discute que os criptoativos devem, ou não, serem regulamentados pelo Estado. Essa discussão está não apenas inserida no âmbito nacional, mas, também em outros Mercados ao redor do mundo.

Recentemente o Presidente da Securities and Exchange Commission (SEC – A Comissão de Valores Mobiliários dos Estado Unidos) destacou que a indústria dos criptoativos não necessita de nenhuma regulamentação para emissão de tokens.[1]  De fato, a ideia da criação do mercado de criptoativos nasceu, precisamente, para não existir regulamentação por parte dos Bancos Centrais.

Ocorre que não é incomum que a utilização desses ativos, que possuem ferramentas que dificultam a identificação do usuário/investidor, para financiamento de atos ilícitos. Além de tal situação, a alta volatilidade deste mercado sempre preocupo as Autoridades Centrais.

Neste aspecto que, desde 2015, tramitam diversos projetos de regulamentação dos criptoativos no Brasil. Porém, recentemente, todos esses projetos foram reunidos no Projeto de Lei 4401/2021.

O PL 4401/2021, que anteriormente possuía a numeração 2303/2015 está em trâmite no Congresso Nacional, e aguarda votação da Câmara dos Deputados, após retorno do texto do Senado Federal. A proposta legislativa possui aspectos positivos, mas, também recebeu algumas críticas pelos players do mercado e, até mesmo, das autoridades reguladoras, como a Comissão de Valores Mobiliários (“CVM”).

No texto da proposta de lei, existe, por exemplo, uma definição do que seria um ativo virtual, isso em seu artigo 3º abaixo transcrito:

Art. 3º Para os efeitos desta Lei, considera-se ativo virtual a representação digital de valor que pode ser negociada ou transferida por meios eletrônicos e utilizada para realização de pagamentos ou com propósito de investimento, não incluídos:

I – moeda nacional e moedas estrangeiras;

II – a moeda eletrônica, nos termos da Lei nº 12.865, de 9 de outubro de 2013;

III – instrumentos que provejam ao seu titular acesso a produtos ou serviços especificados ou a benefício proveniente desses produtos ou serviços; e

IV – representações de ativos cuja emissão, escrituração, negociação ou liquidação esteja prevista em lei ou regulamento.

§ 1º Competirá a órgão ou entidade da Administração Pública federal definido em ato do Poder Executivo estabelecer quais serão os ativos financeiros regulados, para fins desta Lei.

§ 2º Fica autorizada a abertura de conta em prestadoras de serviços de ativos virtuais e a realização de operações com ativos virtuais e seus produtos derivados por órgãos e entidades da Administração Pública, nas hipóteses previstas em regulamento a ser editado por ato do Poder Executivo

Para tanto, os requisitos essenciais para que seja qualificado o ativo como um ativo virtual, seria:

  1. Representação digital de valor;
  2. Negociação ou transferência por meios eletrônicos e;
  3. Utilização de pagamentos ou com propósito de investimentos.

Os criptoativos mais conhecidos, especificamente, as criptomoedas, estariam contemplados por essa qualificação. Todavia, com o avanço da tecnologia, outros criptoativos podem não estarem abrangidos pela nova norma, como é o caso, por exemplo, dos Tokens, especificamente os Non- Fungible Token (NFT).

Esses ativos, que recentemente vem ganhando cada vez mais adeptos e popularidade, não poderia, por exemplo, inicialmente, regulado pela Autoridade Coatora responsável. Em verdade, essa Autoridade também não é definida no texto da possível Lei, caberá ao poder Executivo emitir ato específico definindo tal autoridade, que, potencialmente será dividido entre a CVM e o Banco Central (“BACEN”).

Bem verdade que o descrito artigo 3º, em seu inciso IV, permite que outros ativos sejam incluídos sob a autoridade e supervisão do órgão da Administração Pública, mas, inicialmente, haveria uma lacuna deixada pelo legislador.

Além da definição do ativo virtual, o PL 4401/2021 qualifica a prestação de serviço de ativos virtuais, deixando claro em seu artigo 2º que o funcionamento dependerá de autorização da Administração Pública Federal, sendo esta, competente para definir tais parâmetros.[2] O artigo 4º e 5º destaca as diretrizes mínimas para prestação de serviço de ativos virtuais, que serão:

Art. 4º A prestação de serviço de ativos virtuais deve observar as seguintes diretrizes, segundo parâmetros a serem estabelecidos pelo órgão ou pela entidade da Administração Pública federal definido em ato do Poder Executivo:

I – livre iniciativa e livre concorrência;

II – controle e manutenção de forma segregada dos recursos aportados pelos clientes;

III – boas práticas de governança, transparência nas operações e abordagem baseada em riscos; IV – segurança da informação e proteção de dados pessoais;

V – proteção e defesa de consumidores e usuários;

VI – proteção à poupança popular;

VII – solidez e eficiência das operações; e

VIII – prevenção à lavagem de dinheiro e à ocultação de bens, direitos e valores e combate à atuação de organizações criminosas, ao financiamento do terrorismo e ao financiamento da proliferação de armas de destruição em massa, em alinhamento com os padrões internacionais.

Art. 5º Considera-se prestadora de serviços de ativos virtuais a pessoa jurídica que executa, em nome de terceiros, pelo menos um dos serviços de ativos virtuais, entendidos como:

I – troca entre ativos virtuais e moeda nacional ou moeda estrangeira;

II – troca entre um ou mais ativos virtuais;

III – transferência de ativos virtuais;

IV – custódia ou administração de ativos virtuais ou de instrumentos que possibilitem controle sobre ativos virtuais; ou V – participação em serviços financeiros e prestação de serviços relacionados à oferta por um emissor ou venda de ativos virtuais.

Parágrafo único. O órgão ou a entidade da Administração Pública federal indicado em ato do Poder Executivo poderá autorizar a realização de outros serviços que estejam, direta ou indiretamente, relacionados à atividade da prestadora de serviços de ativos virtuais de que trata o caput deste artigo.

Práticas como proteção de dados (seguindo o que determina a Lei Geral de Proteção de Dados – Lei 13.709/2018), Prevenção à Lavagem de Dinheiro (Lei 9.613/1998) e boas Práticas de Governança e transparência são essenciais para essa atividade, sobretudo, diante das práticas ilícitas perpetuadas com a utilização dos criptoativos como meio de dificultar o rastreio e identificação de criminosos, bem como financiamento do crime organizado e atos terroristas.

Neste sentido ainda que a nova lei propõe uma reforma em outras legislações já existentes, para submeter os criptoativos sob o julgo da Lei Penal. Especificamente, de acordo com a Proposta Legislativa, seria incluído o artigo 171-A no Código Penal, constando:

Art. 171-A. Organizar, gerir, ofertar carteiras ou intermediar operações envolvendo ativos virtuais, valores mobiliários ou quaisquer ativos financeiros com o fim de obter vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento.

Pena – reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa

Igualmente, os criptoativos estariam inseridos nos delitos previstos nos Crimes Contra o Sistema Financeiro (Lei 7.492/1986) e Lei de Prevenção à Lavagem de Dinheiro (Lei 9.613/1998), aplicando-se também, na atividade exercida no mercado de criptoativos, o que determinar o Código de Defesa do Consumidor.

A partir desta breve explanação, percebe-se que o texto do PL 4401/2021 poderá ser emendado no curso de sua tramitação, a qual aguarda deliberação pela Câmara dos Deputados desde maio de 2022. Ainda, será possível, por exemplo, que outros temas sejam discutidos, como é o caso do PL 1600/2022, a qual se postula a alteração do artigo 835 do Código de Processo Civil, para que os criptoativos sejam inseridos explicitamente na ordem de penhora dos ativos que podem ser buscados em uma Execução.

Certamente a regulamentação dos criptoativos detêm amplo de debate, que será explorado com exaustão pelos legisladores, e, posteriormente, pelas Autoridades Competentes, tais como a CVM e o BACEN.

Fique ligado em nossas próximas publicações sobre este tema e demais assuntos no Mercado Financeiro e de Capitais.


[1] https://www.infomoney.com.br/mercados/mercado-de-criptomoedas-nao-precisa-de-mais-regulacao-diz-presidente-da-sec/

[2] Art. 2º As prestadoras de serviços de ativos virtuais somente poderão funcionar no País mediante prévia autorização de órgão ou entidade da Administração Pública federal.

Parágrafo único. Ato do órgão ou da entidade da Administração Pública federal a que se refere o caput estabelecerá as hipóteses e os parâmetros em que a autorização de que trata o caput deste artigo poderá ser concedida mediante procedimento simplificado

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